sábado, 25 de abril de 2009

Palavras entre parênteses

Chega mais perto
Toque meu corpo
Sinta o calor que dele emana
Pra esquentar seu frio.
Deixa o passado no passado
E que o presente seja espelho do futuro.
Esqueça o mal que lhe fiz
Não sou remédio, mas lhe faço bem.

João

Antes de mais nada, eu quero afirmar que essa foi minha primeira crônica escrita há mais ou menos 5 anos.Penso que chegou a hora de postá-la. Perdoem-me os leitores de senso crítico aguçado...esses são os primeiros passos de quem ainda tenta aprender a andar...

Houve por bem consertar idéias retorcidas e distorcidas que se emaranham na memória. Houve por bem deletar lembranças esparsas, abundantes para quem vive na solidão. Foi assim que conheci João.
João era um moço comum, de grandes idéias e poucos sentimentos. Cresceu vendo o pai se desentender com a mãe e a mãe bater nos filhos, inclusive nele próprio.Qualquer mesquinhez era motivo mais que suficiente para descarregar tensões. Via seu pai incansável sair todo dia de manhã a trabalhar a terra, temperando-a com o próprio sal de seu corpo. Putz; como fazia calor naquelas bandas. A terra ressequida rasgava sua pele e foram muitas as vezes que o sal do súor de seu pai misturava-se com o amargor das lágrimas, porque a lavoura, o trabalho de meses nada produzia.Era o tempo das "vacas magras", como se dizia, no qual pouco se comia e também pouco se dormia por causa da fome. Triste fora a infância de João. Os fatos, pequenos detalhes do seu passado retratados por lábios e línguas ásperos de quem muito sofreu na vida e tornou-se insensível à dor.
Era quase meio-dia quando encontrei João jogado num canto da grande Estação Rodoviária de São Paulo: a Barra Funda. Seu corpo franzino demais para um rapaz de 23 anos, deu-me a impressão de quase morto. O olhar perdido, distante. A vida é mesmo dura, concluí ao observar João. Pedaços ruíns da vivência não se esquece de uma hora para outra, me certifiquei. Somos como que caminhões de carga, que a cada dia, lotamos mais nossa carroceria com o que vivemos ou deixamos de viver ou ser."Ser ou não ser:eis a questão"-já afirmava Shakespeare. E foi assim que aconteceu com João. De infância sofrida no sertão agreste para marginal por falta de oportunidades na grande São Paulo: cidade que ilude com suas luzes e promessa de vida fácil. Hoje, João tornou-se um João-Ninguém, um abandonado da vida, não porque abandonou a vida, e sim porque a vida o abandonou. Suas palavras trôpegas e entrecortadas pelos suspiros de dor ou de saudades, deram-me a noção exata do cruel destino dele.
Veio para São Paulo na ilusão de um bom emprego. Batalhou e economizou muito, dormindo as vezes sem comer, alimentando esse sonho. Cidade grande, muita gente, muitas fábricas, grande necessidade de mão-de-obra (o que João não sabia era que essa mão-de-obra fosse tão barata, a ponto de não sustentar a mão que faz a obra). Hoje João não come para dormir, não porque precisa economizar, mas porque não tem o que e nem como comer.
No canto mais sombrio da estação, João linguajeia coisas que aprendeu: roubar com peso na consciência, usar drogas para tapear a realidade, se imiscuir do meio social para não ter o seu rosto conhecido entre tantas outras coisas. O que ele não sabe porque ninguém lhe contou é que o José, o Francisco, até mesmo a Maria t~em uma trajetória parecida com a sua. No caso da Maria quase sempre existe um agravante: o ventre cheio ou os braços ocupados por uma criança de destino incerto.
Bem que João lutou para sobreviver de maneira digna, mas a massa o empurrou no canto e não satisfeita com isso, passou por cima dele. Aí João desistiu. Existe uma parte de sua vida que deletou, inclusive seu futuro. Não tem mais sonhos nem ambições. Não se preocupa com o presente enquanto apaga seu passado da memória. Não sabe mais quem são seus irmãos, se é que ainda tem irmãos. A imagem de seus pais quase que se apaga na memória. Incrível como o sofrimento em pouco tempo detona a dignidade humana. João é só mais um rosto sofrido dos muitos que sofrem no país-afirmam alguns. Mas antes de tudo, João é único, tem sua dignidade própria que, embora já esquecida, demonstra sua fragilidade na falta de expectativa. Aprendi muito com João. Sua dignidade ferida ensinou-me a valorizar a minha e lutar pelas daqueles que estão jogados à margem da sociedade.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Poetizar a vida

Eu busco inspiração
Pra escrever uma poesia
Que acalente o coração
Do menino sem alegria
Que possa dar razão
À vidas que são vazias
E que arranque da escuridão
Olhares longe da luz do dia.

Eu busco inspiração
Pra transformar as letras do papel
Em singelas mensagens
Necessárias porém.
Busco inspiração
Pra descrever a fome de quem não tem pão
A sede do planeta que já se começa a sentir
A tristeza dos sem expectativas
A falta de trabalho para os sem chances
A ausência de dentes para quem já não consegue sorrir.

Num mundo onde se come o sal do próprio súor
E se bebe as próprias lágrimas
Eu busco a inspiração tão precisa
Para colocar no coração das pessoas
A esperança insubstituível
De que letras em versos
Têm poder de transformar o mundo.

Poetizar a vida ainda é remédio para os males humanos...

domingo, 19 de abril de 2009

Parafraseando...


Quero o sol do amanhecer;
A luz do meio-dia;
O crepúsculo do entardecer.
Num país de sombras mortas...
De nomes desnomados...
Do esquecimento das dores alheias...
Da inércia social;
São coisas que acalentam a alma!