terça-feira, 24 de novembro de 2009

Finda o seco



Acabou-se o seco
O seco profundo
O seco intrínseco
Que devasta o mundo.

Acabou-se o seco
O seco imundo
Da miséria, da pobreza, da maldade
Do que desnuda a fundo
O mistério da humanidade.

Acabou-se o seco
E seco foi dizendo
Que o mundo morre
Que morre o sentimento
Que morre o homem
Que tudo está morrendo.

E suas palavras rudes
Foram convencendo
De tal modo que de fato
Tudo foi se desfalecendo...

No fundo só ficou a esperança
Com sua atitude bravia
Tendo a firme certeza
Que tudo renasceria
E que somente o seco
O seco profundo, intrínseco
Imundo se acabaria.


P.S. O seco tratado aqui se relaciona com tudo o que é ruím na humanidade...

terça-feira, 10 de novembro de 2009

A força de Sansão


Cem, cento e cinquenta quilos. Os músculos chegavam a enrijecer e foram muitas as vezes que travavam de tal modo que a ajuda do personal se fazia necessária, afim de evitar um acidente. Já imaginou sair estampado na primeira pagina do jornal: “Praticante de atividade física é morto por cento e cinquenta quilos”. Ai o leitor relapso poderia ficar imaginando de que seriam esses quilos todos, se não se preocupasse em ler a reportagem inteira. Talvez se colocassem uma foto com o pescoço deflagrado ou quem sabe uma caricatura do desastre, tudo ficaria mais fácil de ser entendido. Com certeza médicos ortopedistas pelo exame pos mortis, tentariam recompor a trajetória da barra de ferro antes de atingir o pescoço da personagem dessa crônica. Mas não é esse o assunto que se pretende narrar aqui, mas sim um episódio hilário que aconteceu com a personagem.
Henri ia a academia à tarde, quase sempre com o sol a pino e o calor sufocante, principalmente no verão, quando tudo parecia se multiplicar. Mas era acostumado a esse calor. Sua alta estatura, seu corpo robusto e forte, esculpido por anos de academia já havia se habituado a tais condições. Acontece que, na semana tida como a mais quente do ano de 2009, quando sentado e sem fazer movimentos já se suava muito (agora imagine o leitor se o individuo se exercitasse), Henri foi acometido de um resfriado. Todos sabem o quanto um resfriado é capaz de amolecer qualquer corpo, ainda mais no calor. E Henri então suava muitíssimo, sem falar da falta de ar que sentia por causa da coriza que lhe tapava o nariz, restando-lhe o recurso de respirar pela boca. Quando estava no meio do seu treino diário e como diz o caipira “aperreado” de tanto cansaço, lembrou-se de pedir auxilio a algum santo, talvez protetor dos atletas. E foi assim que perguntou a um outro individuo que treinava também no mesmo horário.
-Roberto, você conhece algum santo que seja bombadão, saradão, do tipo que seja protetor de atletas?
Roberto como bom conhecedor desta área, pois quando mais novo havia estudado muito a vida dos santos respondeu:
-Bom, de momento não me recordo de nenhum...
- Não tem um tal de Hércules?-perguntou Henri.
-Mas Hércules faz parte da mitologia grega, foi um herói e não um santo...
Foi então que Henri tomou um ar reflexivo, pensou um pouco e disse:
-Ah, tem Sansão...
-É, Sansão faz parte da história bíblica, mas ao que me consta não é considerado santo-concluiu Roberto.
-Verdade. Ele tinha forca nos cabelos né?
-Sim, cabelos esses que foram cortados pela traição de Dalila.
A conversa cessou por ai, mas o que se ouviu uns instantes depois, fez a academia toda se sacudir em risada. Até o personal serio e centrado não pode conter o riso. Henri, no auge de seu cansaço, com a roupa toda molhada de suor e ainda com muitos exercícios a fazer, olhou para o alto, levantou as mãos e gritou com força:
-Sansão... Dê-me a força de seus cabelos!!!

domingo, 1 de novembro de 2009

Sobre hábitos e lingeries


Brancas, azuis, pretas. Rosas nas mais variadas tonalidades e modelos. Vermelhas também e uma gama de outras cores. As calcinhas pendiam das gavetas do guarda-roupa e da cômoda. Eram tantas que se alguém porventura inventasse de contá-las perderia um bom tempo de um precioso dia. Clara, a dona das calcinhas tinha o hábito (aí analise o leitor bom ou ruim) de colecioná-las. Dizia que usar uma só por dia não era bom, por isso as trocava três vezes. E nunca gostava de repeti-las. Então agora entende o leitor o porquê da descrição feita no início desta crônica. Eram tantas, muitas calcinhas, até mesmo porque Clara não era mais nenhuma menininha e já contava com seus 38 anos e alguns meses e, desde seus 18 anos já mantinha esse hábito. E só não começou mais cedo porque não era independente financeiramente. A briga depois que arrumou seu primeiro emprego foi enorme. O salário minguado que ganhava mal dava para sustentar seu hábito. Sempre tinha uma justificativa para tal. Às vezes dizia que era para agradar o namorado, outras porque se sentia melhor assim. Mas o importante mesmo é que esse hábito contumaz a fazia se afundar cada vez mais em dívidas, tanto que, com seus 20 anos seu nome foi incluído no SPC e no SERASA, de onde nunca mais saiu. E não vá admirar o leitor se afirmar aqui que os débitos de Clara eram em lojas de lingerie. Se alguém sugerisse que ela fizesse um bazar ou uma doação de um pouco de suas calcinhas, era para comprar briga na certa. Clara não admitia que nenhuma delas se perdesse. Guardava, desde aquela primeira que comprou com o dinheiro de seu primeiro pagamento daquele primeiro emprego, até a última que comprara ainda há algumas horas e com a qual se vestiria nessa noite para “surpreender” o esposo. Passara o dia todo nesta árdua tarefa de encontrar um modelo tão diferente e uma cor tão única que estava até se sentindo esgotada. Mas não podia estar assim a noite. Era aniversário de seu casamento e o esposo prometera a levar para jantar num restaurante fino. E depois do jantar, a festa particular tinha que estar garantida. Foi assim que decidiu se banhar longamente com sais relaxantes. Chamou então a empregada e deu-lhe ordens para encher a banheira e preparar o banho.
Talvez o leitor possa estar se questionando aqui o seguinte: se Clara estava com o nome sujo e não tinha mais crédito nem para comprar calcinhas, como poderia ter regalos como banhos relaxantes e uma empregada em casa? Não tiro a razão de meu leitor, mas Clara tivera sorte na vida, casara-se com um homem rico que na época de namoro a enchera de jóias e que agora lhe dava todas as mordomias possíveis. A única coisa que não fazia ou imaginava não fazer, porque Clara “surrupiava” uns trocados de quando em quando, era manter o hábito dela. Clara chegou a fazer isso porque o dinheiro que ganhara com as jóias já havia acabado e entenda o leitor que foi muito bem investido na compra de calcinhas, até o último centavo. E assim fez, despiu-se e um instante antes de entrar na banheira, olhou-se longamente no espelho. Admirou-se, pois ainda possuía formas perfeitas, apesar do casal de filhos que tivera por exigência de seu esposo, porque por ela, não arrumaria nenhum. Adentrou-se dentro da banheira, acomodou a cabeça e fechou os olhos. E relaxou muito.
À noite estava linda; o vestido azul lhe caía muito bem, com seus decotes ousados. Queria provocar o esposo, despertar-lhe o desejo, renovar o amor. E foi assim que aconteceu. A noite se estendeu pela madrugada e aquela festa particular só acabou com os primeiros raios de sol. Ela estava exausta, mas seu esposo satisfeito: havia cumprido seu papel de mulher, de esposa e sentiu-se jovem. Mal amanheceu o dia levantou-se e resolveu sair, afinal seu hábito de comprar lingeries não se acabara. E comprou outras tantas com o dinheiro que conseguiu por aquele anel que ganhara do esposo na noite anterior. E assim continuou sua vida, até aquele inexplicável dia, ou melhor, manhã.
O esposo de Clara ao acordar não a encontrou na cama. De momento não se assustou, nunca a encontrava mesmo. No entanto, quando foi ao banheiro tomar seu banho matutino e se preparar para mais um dia de trabalho, quase teve um enfarte, Clara estava morta, pendurada pelo pescoço por suas calcinhas, amarradas uma nas outras. A policia investigando o caso, não encontrou explicação plausível para a morte dela. O único que tentou explicar foi o psicanalista com o qual Clara se consultava de vez em quando. Segundo ele, Clara se matou pela força de seu hábito e a maior prova disso era a de que se enforcara com as calcinhas. Mas a maioria da população daquela cidade acredita piamente que Clara não se matou, mas foi morta pelas calcinhas, o que bem poderia se encaixar na explicação do psicanalista, a não ser pelo fato de que, as pessoas diziam que as calcinhas de Clara se revoltaram porque eram usadas uma única vez e se organizando planejaram com mínimos detalhes como seria o fim dela e assim fizeram...

domingo, 18 de outubro de 2009

Amor de salvação


Quero olhar você sem misturar os sentimentos
E perceber que lá de dentro
Existe nova razão.
Quero beijar você numa busca de acalento
E aproveitar este momento
Para curar meu coração.

Você que chegou do nada
Talvez apenas seguindo sua estrada
Tocou meu viver.
Então, meu coração em disparada
Minh’alma desamparada
Encontrou o sentido de ser.

Não pense que talvez não exista
Amor tão grande que crepita
Com a primeira impressão.
Divagar sobre possibilidades
Anulando a realidade
Nem sempre é explicação.

De tudo só quero que entenda
Que precisava de algo assim
Explicação que não se explica, briga sem contenda
Que pudesse trazer a mim...

Uma dor que não doesse
Um fogo que não queimasse
Um momento de perdão.
Um instante de ausência
Que perdido nas reticências...
Simplesmente se tornasse... AMOR DE SALVAÇÃO!

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Véritas Mentiras

Trazia-a sempre consigo. Devotava-a infinitamente. Ouvir sua voz de quando em quando era para ele um momento de glória, um sinal de que ela não o abandonara. Até mesmo quando dormia, ela continuava ali e, foram raras as vezes em que, ao acordar e procurando-a não a encontrou a seus pés, olhando-o de soslaio. E ainda assim, se não estivesse ali era só chamá-la e ela prontamente se fazia presente. Gostava disso: ela lhe era cativa, submissa, assim pensava.
Ah, a verdade! Sua vida sem ela não fazia sentido, sem ela suas atitudes seriam vazias, seus objetivos de nada valeriam. Ah, a verdade! Sempre a perseguira e agora que a tinha não pretendia deixá-la nunca. Mantinha com ela uma relação íntima: ela sabia de seus segredos mais bem guardados e ele a sondava cada vez mais. Como era bom deixar a verdade percorrer seus músculos, seus nervos, suas veias. Navegar suas artérias e adentrar seu coração e cérebro, invadindo também aquela área abstrata, responsável, no entanto, pelas coisas chamadas concretas. Seu pensamento era todo verdade. Depois que a cativara, sua vida tornara-se toda verdade. E assim ele vivia: um segundo de mentira era inadmissível. E sabia que, se por acaso trocasse um olhar sequer com a mentira, se culparia pela eternidade. A própria verdade se ocuparia de acusá-lo para sempre. Então, evitava aborrecimentos.
No entanto, os anos passaram rápido, a idade avançou e a verdade amadureceu junto com ele. Quando adoeceu e padeceu as agruras da carne por causa de sua velhice, a verdade foi sua melhor enfermeira. Enquanto ele dormia no leito do hospital, ela se mantinha em pé, ao lado da cama, segurando sua mão. O calor da verdade lhe consolava e afagava seu coração. Já não se importava com seu fim eminente, menos ainda se outra vida havia depois dessa que vivia. Se houvesse também seria de verdade eternamente e, caso não houvesse, não importava; havia vivido intensamente cada instante.
No ultimo dia, o fatídico dia que, desenganado pela junta médica sabia que morreria muito em breve, ao acordar, não encontrou a verdade; ela partira. Na mesa que ficava ao lado da sua cama havia um bilhete que ela deixara. Foi com muito esforço que conseguiu pegá-lo e com sofreguidão e a vista a lhe embaraçar que leu com lágrimas nos olhos. A reação a seguir foi um nó na garganta a lhe tirar a respiração e um cessar instantâneo das batidas do coração. O atestado de óbito acusava como causa mortis uma parada cardiorespiratória, apesar do câncer que supostamente o haveria de matar. O bilhete deixado pela verdade antes de sua partida dizia o seguinte:
“Caro Luis, por toda sua vida lhe fui fiel, mas não seria justo te enganar até o último instante, sou a sua verdade tão somente, que você construiu a partir de mentiras tidas como verdades. Sua vida foi uma grande mentira vivida como se fosse verdade. Adeus. Deixo-te com a única verdade que de fato existiu: de sua maior inimiga que sou eu, a mentira, você se fez amigo e eu nada mais fiz que retribuir, enquanto que aquela que pensava ter, a verdade de verdade, você sempre desprezou e agora já não pode mais alcançá-la. Descanse em paz. Essa é minha verdade para você”.

A moral dessa crônica deixo para você leitor tirar. Só espero que, como a personagem da história, Luis, não acredite estar concluindo uma mentira por verdade. De fato, há que se considerar que, uma mentira pode ser vista como verdade e vice-versa.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Os amantes


Estava lívida. As intuições a se embaraçarem com a consciência. Muitas ideias lhe vinham à cabeça. Talvez fossem à procura de explicação para o que acabara de acontecer. Nem tivera tempo de olhar o esboço do rosto que há alguns minutos estivera ao alcance de suas mãos e lábios. Saíra correndo sem olhar para trás. Aquela praça, aquela brisa suave eram-lhe agora o que a acalmava, o que fazia seu coração voltar a bater no ritmo certo, porque por um instante de tempo pensou que este haveria de lhe sair pela boca. Agora tentava acalmar as ideias e colocar sua consciência em paz. Afinal, nada acontecera ainda. Estremeceu com essa expressão que lhe rodou o pensamento. Ainda era a afirmação de que algo poderia vir a acontecer. Não entendia, mas ao mesmo tempo queria entender o que estava acontecendo com ela. Seu casamento já durava quase dez anos e amava seu esposo, disso não tinha dúvida. Ele era para ela tudo: companhia, porto seguro, cumplicidade e etc. Ele sempre lhe fora bom e bem sabia que assim continuaria a ser, até o fatídico dia da separação inevitável. Mas agora estava ali, com a consciência a lhe cobrar um beijo que nem chegou a acontecer, pois fugira antes. Como entender o que estava acontecendo? Sentia um turbilhão de ideias a lhe embaraçar o pensamento, ao mesmo tempo em que um misto de sentimentos lhe varava o coração. Sempre gostara de aventuras e não seria esse mais um de seus caprichos para se aventurar? O risco lhe enchia de adrenalina e ela gostava disso, bem sabia.
Recordava agora como foi o início de tudo. Aqueles olhares trocados durante o expediente. Ele era seu colega de trabalho e até então, nada lhe havia passado pela cabeça. Ele era apenas um colega, nem amigo era. Mas depois daquele dia em que ele a olhou diferente, algo despertara dentro dela. E as trocas de olhares se acenderam e se tornaram em brasa e constantes. Ela sempre o achara bonito, atraente.Ele, por sua vez, já estava quase se casando. Sempre afirmou amar sua noiva e ser com ela que iria se casar. Nisso estavam iguais: o amor pelo seu esposo era inquestionável.
E tudo culminou no que acabara de acontecer. Ela estava só na sua sala quando ele entrou e se aproximou...
-Aurélia!- seu nome expressado de forma tão doce a fez arrepiar e amolecer ao mesmo tempo. Suas pernas bambearam e ela ficou sem ação. Ele chegou mais perto e pegou em suas mãos que estavam geladas e suadas. Automaticamente ela se soltou e lhe segurou o rosto. Seus olhares se fundiram e quando tudo parecia que iria se consumar, ela se esquivou.
-Não posso, Alexandre!- e afastou-lhe a face. Pegou sua bolsa e com a desculpa de que precisava ir ao banco, correu a se refugiar naquele canto da praça que lhe era tão familiar. E ali estava até agora.
Olhou para o relógio, ainda dispunha de algum tempo. Recompôs-se e com passos firmes e olhar altivo retornou ao trabalho. Havia decidido esquecer aquele episódio, talvez pensando que cérebro humano funcionasse como memória de computador, um ctrl T e um delete e tudo estaria resolvido.
O restante do dia passou sem novidades e ao chegar em casa, encontrando seu esposo tão sorridente e carinhoso a lhe esperar, imaginou que deveria lhe contar tudo, mas numa fração de segundos, esqueceu essa possibilidade. Não havia acontecido nada e mesmo que houvesse não podia estragar seu casamento com isso.
Outros dias se passaram e as trocas de olhares continuaram, só que agora ainda mais ardentes, e ela foi se convencendo de que precisava provar daquela boca. Afinal, só precisava de um beijo e este não deixa marcas, nem arranca pedaços. Nas primeiras vezes que pensava nisso, sua consciência ainda a alertava para o risco de seu casamento se acabar se ela gostasse desse beijo e quisesse mais e cada vez mais e sempre mais. Com o passar do tempo, porém, isso também passou. Seu esposo continuava bom e alheio a tudo e ela o continuava amando.
Numa sexta-feira, Alexandre se aproximou e perguntou:
-Você sabe que dia é hoje?
-Não-respondeu secamente, mas sabia que era seu aniversário.
-Hoje é meu aniversário e gostaria de ganhar um presente seu...
Ela corou. Suas faces queimaram e, sem encará-lo balbuciou:
-E que seria esse presente?
-Um beijo...
Ela o encarou. Seus olhos verdes eram doces, ternos, pedintes. Sua boca estava entreaberta, mostrando seus alvos dentes, que faziam par perfeito com seus lábios carnudos e vermelhos.
Foi numa fração de segundos e ela sentiu a boca de Alexandre colada na sua. Sentiu-se lânguida com a consciência a lhe apitar alguma coisa. Que se danassem as demagogias sociais, e os contratos, e os acordos, e a razão, e a sua própria consciência. Que se danasse tudo. Não podia mais correr, fugir, se esconder, se esquivar. Então fechou os olhos e entregou-se toda naquele beijo...

sábado, 8 de agosto de 2009

Liberdade não se come


O sol ainda nem havia nascido e Bentinho já se colocava em pé. Estava tão acostumado a essa vida e com seus "deveres" para com o patrão que fazia tudo muito direitinho; até mesmo de olhos fechados se preciso fosse. Levantar cedo, ordenhar as vacas, levar o leite para sua mulher que trabalhava na casa do patrão preparar o café. Depois ir para o roçado e trabalhar o dia todo sob o sol escaldante, só parando para se alimentar ou saciar a sede; ou ainda para atender alguns caprichos inadiáveis da natureza humana. Gostava da vida que levava e nunca parava para pensar se haveria amanhã; afinal avida vinha sendo generosa para ele: todo dia tinha o que comer e com isso seus filhos cresciam fortes, tão diferentes dos de seus antepassados ou até mesmo de alguns de seus irmãos de sangue que morreram de fome.
Quando o sol se punha, Bentinho voltava do roçado trazendo nas costas sua enxada e nas mãos os sinais de muitas ervas daninhas extintas. Depois de se banhar e degustar um naco de carne seca com uma boa medida de farinha, o que lhe era dificultado pela presença de poucos dentes, Bentinho se reunia com os filhos e a mulher em volta de uma fogueira no terreiro da casa. Aí os "causos" se tornavam a atração da noite e prendiam a atenção de todos. Saci-pererê, boi-tatá, lobisomem, assombração: cada noite um causo diferente. Aproximada as vinte e duas horas, todos se recolhiam, inclusive Bentinho e sua mulher Iraci e, quando o cansaço não atrapalhava, colocavam pimenta na sopa do casamento. E se amavam rindo, antes de caírem no pesado sono dos justos. No outro dia, tudo recomeçava. E assim vivia Bentinho.
Conta-se que ele havia fugido do Quilombo uns dias antes da sua invasão e destruição. Era ainda um meninote e preferiu viver, pois vivo sabia que poderia lutar e quem sabe vencer. Iraci ele conhecera em suas andanças pelas vilas. Não era bonita nem feia, mas cativara o coração de Bentinho e ele o dela. Numa madrugada qualquer de um dia ainda não nascido que já não se lembra mais a data, Iraci abandonou a casa de seus pais e fugiu com Bentinho. Andaram um bom tempo a esmo, até que Genésio, um rico fazendeiro os acolheu. Em troca dos trabalhos que fariam, ele lhes daria comida, um salário minguado e uma choupana para morar. Pouco tempo depois os filhos vieram e Iraci mais Bentinho se afeiçoaram àquela rotina já descrita anteriormente.
Um certo dia porém, a rotina se desfez. O patrão havia mandado chamar Bentinho antes mesmo dele ordenhar as vacas. Encostado na porta da biblioteca do patrão e com o chapéu na mão, ele assimilou uma por uma as palavras que ouviu:
-Olha Bentinho- começou Genésio- desde que chegou aqui já se vão quinze anos e parece que foi ontem mesmo. Andei fazendo umas contas- disse- e a situação não anda nada boa. É por isso que não posso mais te manter aqui. Tirei do banco ontem, uma boa soma de dinheiro suficiente para você começar a vida em outro lugar. E aqui está-afirmou entregando um grande maço de notas novas a Bentinho e complementou- você está livre agora. Vá-se embora. Vá cuidar de sua vida.
Um pouco triste, Bentinho pegou aquele maço e, enquanto se dirigia para casa afim de contar a nova para os filhos, um sonho de outrora lhe passou pela memória:há alguns anos desejara viver na cidade. Seus olhos se iluminaram e em apenas dois dias, ele se mudava juntamente com sua mulher e trupe de filhos para uma vida nova.
Assim que chegaram à cidade, Bentinho alugou uma casa e começou a procura emprego, mas este não se permitia ser encontrado. O tempo passou e o dinheiro minguou. Os filhos agora maiores comiam mais, o que fazia com que o dinheiro se esvaísse muito rapidamente. Até que o fatídico dia chegou. Genésio enxergou d elonge na estrada aquela procissão e reconheceu Bentinho e sua família a alguns metros do casarão. Com a cara deslavada, Bentinho pediu abrigo: agora ele e Iraci trabalhariam apenas a troca de casa e comida. A única explicação dada por Bentinho quando questionado por Genésio a respeito do regresso foi essa:
-A gente não come liberdade, patrão! A gente não come liberdade!

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Loucuras absurdas

Vejo a vida num turbilhão a passar
Vejo o mundo pelo avesso a se revirar
Vejo sombras a fugir
E o medo invadir
E eu só querendo encontrar o começo...

O começo da dor, da ilusão
O começo do amor, da paixão
O começo de Deus
O começo do que não tem fim
Nem começo...

sexta-feira, 19 de junho de 2009

O sono da cidade

A cidade dorme
E no silêncio da noite pode-se ouvir seu ronco.
Poucos carros a trafegar
Poucos transeuntes a passar
Marcando com os passos
As batidas de seu coração.

A cidade dorme
E sonha. E tem pesadelos
No seu interior tantos germes
A se aproveitar do breu
Dos olhos fechados e a mente distante
Do desligamento desse mundo.

Enquanto sonha, vê o menino com as mãos sujas
De sangue.
Enxerga também outras mãos sujas
Do roubo.
Identifica outras tantas mãos vazias
De esmola.
Cujos corpos repousam no sereno e
Cujas bocas só recebem aguardente para espantar o frio.

Enquanto sonha, identifica suas próprias diferenças
Observa de fora o seu próprio caos social
Delineia com seus olhos embaçados
O vulto da morte que age no escuro.
E se encanta com madrugadas
Intensas de amor.

A cidade dorme
Enquanto eu, sem sono aparente
Sondo suas ruas, observo sua avenidas
Procuro seu coração.
Pois sei que, apesar da aparente calmaria
Os movimentos são sutis
Pra quem se aproveita do sono da cidade
Para arrancar sua máscara e
Mostrar seu verdadeiro rosto.

Faço parte do sono da cidade
E nos seus sonhos, sou seus olhos
Na realidade; enquanto a cidade dorme
Eu permaneço acordado.

domingo, 7 de junho de 2009

Momentos...


Um olhar, um sorriso...
Um afago, um desejo de pegar a mão
E instintivamente levá-la à boca
Acariciando-a com um beijo
Deixando clara a intenção
De segurar o rosto, olhar os olhos
E beijar a boca com emoção.
Num eclipse de consciência, do eu razão
Permitir o sentimento abrir os seus braços
E acalentar o compasso do coração...
São momentos que sonho de olhos abertos
Para conseguir buscar o sentido enfim...
De outros momentos vividos a contento
Com meu flertado sentimento
Que me faz comportar assim...

Para alguém, cuja lembrança dos momentos que juntos estivemos não se apaga na memória

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Destinos


Duas vidas, antes desconhecidas
Um encontro que por acaso ou não
Encerra um destino.

Duas historias de viagens, migrações
Um lugar para parar
Marca um início.

Dois olhares receosos e curiosos
Um espaço entre eles
Uma vontade de estar mais próximos.

Duas distâncias encurtadas
Uma mão que as une
Numa mesma encruzilhada.

Não quero mais caminhar sozinho
É momento de querer estar junto
Experimentar a vida partilhada
Numa mesma estrada.

Não sei onde vou
Mas o destino me trouxe aqui
Para o que também desconheço
Vou viver este momento
Quem sabe se, no final de tudo
Eu descubra, meu destino com o seu entrelaçado
Que não nos permita mais viver separados.


Para alguém que conheci ontem...

domingo, 24 de maio de 2009

Conselhos para ser feliz

Não tente entender tudo
Tem coisas que não se precisa saber
Para continuar vivendo.
Não queira ser tão sóbrio
Embriagar-se da vida faz bem para o corpo
E cura a alma.

Não se preocupe em escolher tantas coisas
Você só precisa escolher o CAMINHO
Suas outras escolhas estarão nele.

Ao invés de olhar para as dificuldades
Olhe para a meta.
Quando se coloca o objetivo à frente
As dificuldades são apenas os detalhes
Que dão sabor à conquista.

Quando quiser ser realista
Não dê como desculpa sua sinceridade.
Ser realista e ser sincero, embora parecidos são diferentes.
Quer uma realidade?
O mundo cada um faz o seu e
Sua sinceridade nunca será o suficiente para descrevê-lo.

Pensar e sentir nem sempre funcionam como lei da física: ação e reação.
Tem pessoas que se negam a pensar mas
Nem por isso deixam de sentir ou
Vice-versa.

Cultive a amizade, o amor e o respeito aos outros
Pois na vida, mesmo que você não concorde,
Eles são o seu espelho.
Não seja indiferente nunca
A indiferença maltrata o coração de quem a recebe
E endurece o de quem a pratica.

Busque sempre as melhores coisas
Não se esquecendo que para alcançá-las
Você precisa passar pelas ruíns.
De fato, a vida seria um tédio e um convite ao suicídio
Não fosse as dificuldades que encontramos nela.

Não desanime nunca
O desânimo é próprio dos perdedores
E sua palavra de ordem é VENCER SEMPRE.
Não reclame
A reclamação te amarra aos problemas
E estes precisam ser superados.

Tenha um pouco de santo e um pouco de pecador
A justa medida entre os extremos
É que faz de você um SER VIRTUOSO.

Sorria sempre e muito.
O bom humor evita doenças
E alivia o estresse;
Além de tornar a vida mais interessante.
Quando puder, ria de si mesmo
Nada mais curativo
Que assumir seus defeitos e
Exaltar suas qualidades.
Quando se admite um defeito
Se abre a possibilidade para melhorá-lo.

A vida é uma escola
Por isso não perca nunca a chance de aprender
E não se esqueça:
São nas coisas simples que está a matéria-prima para o aprendizado então
Não se preocupe com superficialidades.
Para aprender com a vida
Basta apenas amar sua escola.

Enfim; não deixe de forma alguma, de viver esse momento
Hoje é importante e viver o agora é essencial, se quiser ter uma vida longa, saudável e duradoura.
Em qualquer situação é importante entender que
O mundo é uma bola e continua girando sempre
Pra que lado não importa
O importante é não se perder nos seus giros
Porque é só assim que vai descobrir e entender
Como é viva a magia da vida!!!

domingo, 17 de maio de 2009

SOS Planeta Terra...ou deveria dizer Água

É um caso sério...se não cuidarmos de nossa ganância, a Terra não cuidará de seu controle...

domingo, 10 de maio de 2009

À minha mamãe...


Revirando minhas coisas (aquelas que vamos ajuntando no correr dos anos e que de certa forma nos ajudam a recordar de algo) hoje de manhã, encontrei uma carta que minha mãe me enviou há algum tempo. Mais precisamente do dia 18/06/2008 que entre outros assuntos, ela me informava de sua saúde, dos problemas que estava enfrentando em casa e me afirmando que sempre rezava para que eu estivesse bem. Até me lembro que na época esta carta me deixou impaciente e preocupado com seu conteúdo. Minha mãe estava sofrendo e se tem alguma coisa que jamais gostaria que acontecesse com ela era isso. Sei que minha mãe tem um gênio forte e uma teimosia que se iguala ao seu gênio. Mas é minha mãe e nos embates do dia a dia na minha infância, ela nunca pensou duas vezes para que eu e meus irmãos tivéssemos o melhor que poderia oferecer. Tive uma infância difícil, éramos pobres e sem vergonha alguma assumo isso. Acho que é até por isso que hoje valorizo o que tenho, pois só aprendemos a valorizar o que temos, se nos custa súor e lágrimas. Aliás, isso é recorrente também em nossos relacionamentos, de tal forma que é muito comum encontrarmos pessoas abastadas que se sentem senhoras de si mesmas e auto-suficientes demais para dependerem ou precisarem de outras. Aí infelizmente essas pessoas vivem isoladas e morrem sozinhas. Dos meus tempos de criança, recordo que, nos momentos de mais dificuldades minha mãe dormia sem comer e sorrindo, porque queria nos dar a impressão de que tudo estava bem. Eu, que era um dos filhos mais apegados sempre a via chorando pelos cantos durante o dia. Ainda assim quando me aproximava ela disfarçava para não me entristecer também. Assim cresci, vendo em minha mãe uma heroína e um exemplo a ser seguido. Mulher forte, de fibra, que se esforçou muito para dar uma boa educação para todos os filhos, porque era isso o de melhor que tinha para nos dar. Voltando a carta, depois das saudações finais, ela escreveu assim:“O dom de amar vem de Deus, do amor veio você. Amo sem limites para que você ame sem fronteiras”.
Confesso que isso mexeu e ainda mexe muito comigo. Afinal, uma mãe que se dedica tanto a um filho e que demonstra tanto amor a ele, amor explícito, puro, sem culpa, não pode ter seu dia passado em branco. E digo isso com tanta franqueza, ternura e amor, porque nesse dia das mães, a distância me impossibilitou de visitá-la. É por isso que cá estou a rascunhar palavras em homenagem a essa pessoa que tanto amo, motivo e razão de eu estar aqui e ser o que sou hoje.
Mãe, pode passar o tempo, os problemas, a idade avançar e os cabelos caírem, eu sempre serei seu filho e eternamente serei grato por tudo que nem sempre com palavras me ensinou. Sou uma pessoa feliz e praticamente realizada hoje e não desejo mais nada a não ser estar com minha família e lutar por meus sonhos que ainda não conquistei. Digo isso, porque entre muitas coisas que me ensinou, amar e valorizar a família esteve entre seus principais ensinamentos. E quanto aos meus sonhos ainda não alcançados, olhando para você não me esmoreço, pois é uma guerreira da vida.
Mãe, as palavras são poucas para tanto sentimento de gratidão. Se a vida é mesmo uma escola, posso afirmar sem medo que você, mamãe, é dela uma das melhores mestras. Obrigado por ser minha mãe e por permitir que eu vivesse. Obrigado por cuidar de mim e ainda hoje, mesmo eu sendo homem crescido e formado, se preocupar comigo. É muito certo o que dizem alguns escritores ao afirmarem que “mãe não tem prazo de validade”, pois uma vez mãe, sempre mãe. E posso reafirmar isso com todas as letras, pois mesmo distante com a saudade a apertar o coração, eu me sinto amado, amparado por você. Neste seu dia uma só coisa peço: que Deus nos dê forcas suficientes para vivermos muitos anos e estreitarmos ainda mais nossos laços de mãe e filho. Eu te amo, minha mãe!!!

domingo, 3 de maio de 2009

Crise do poeta

A maior e pior aridez`
É a ausência de idéias
Que, se transformadas em palavras`
Permitem o sentimento fluir
E o coração falar mais alto que a razão.

Mas, onde estão minhas idéias?
Se elas estivessem ao menos entre parênteses
Já me valeriam de alguma coisa.

sábado, 25 de abril de 2009

Palavras entre parênteses

Chega mais perto
Toque meu corpo
Sinta o calor que dele emana
Pra esquentar seu frio.
Deixa o passado no passado
E que o presente seja espelho do futuro.
Esqueça o mal que lhe fiz
Não sou remédio, mas lhe faço bem.

João

Antes de mais nada, eu quero afirmar que essa foi minha primeira crônica escrita há mais ou menos 5 anos.Penso que chegou a hora de postá-la. Perdoem-me os leitores de senso crítico aguçado...esses são os primeiros passos de quem ainda tenta aprender a andar...

Houve por bem consertar idéias retorcidas e distorcidas que se emaranham na memória. Houve por bem deletar lembranças esparsas, abundantes para quem vive na solidão. Foi assim que conheci João.
João era um moço comum, de grandes idéias e poucos sentimentos. Cresceu vendo o pai se desentender com a mãe e a mãe bater nos filhos, inclusive nele próprio.Qualquer mesquinhez era motivo mais que suficiente para descarregar tensões. Via seu pai incansável sair todo dia de manhã a trabalhar a terra, temperando-a com o próprio sal de seu corpo. Putz; como fazia calor naquelas bandas. A terra ressequida rasgava sua pele e foram muitas as vezes que o sal do súor de seu pai misturava-se com o amargor das lágrimas, porque a lavoura, o trabalho de meses nada produzia.Era o tempo das "vacas magras", como se dizia, no qual pouco se comia e também pouco se dormia por causa da fome. Triste fora a infância de João. Os fatos, pequenos detalhes do seu passado retratados por lábios e línguas ásperos de quem muito sofreu na vida e tornou-se insensível à dor.
Era quase meio-dia quando encontrei João jogado num canto da grande Estação Rodoviária de São Paulo: a Barra Funda. Seu corpo franzino demais para um rapaz de 23 anos, deu-me a impressão de quase morto. O olhar perdido, distante. A vida é mesmo dura, concluí ao observar João. Pedaços ruíns da vivência não se esquece de uma hora para outra, me certifiquei. Somos como que caminhões de carga, que a cada dia, lotamos mais nossa carroceria com o que vivemos ou deixamos de viver ou ser."Ser ou não ser:eis a questão"-já afirmava Shakespeare. E foi assim que aconteceu com João. De infância sofrida no sertão agreste para marginal por falta de oportunidades na grande São Paulo: cidade que ilude com suas luzes e promessa de vida fácil. Hoje, João tornou-se um João-Ninguém, um abandonado da vida, não porque abandonou a vida, e sim porque a vida o abandonou. Suas palavras trôpegas e entrecortadas pelos suspiros de dor ou de saudades, deram-me a noção exata do cruel destino dele.
Veio para São Paulo na ilusão de um bom emprego. Batalhou e economizou muito, dormindo as vezes sem comer, alimentando esse sonho. Cidade grande, muita gente, muitas fábricas, grande necessidade de mão-de-obra (o que João não sabia era que essa mão-de-obra fosse tão barata, a ponto de não sustentar a mão que faz a obra). Hoje João não come para dormir, não porque precisa economizar, mas porque não tem o que e nem como comer.
No canto mais sombrio da estação, João linguajeia coisas que aprendeu: roubar com peso na consciência, usar drogas para tapear a realidade, se imiscuir do meio social para não ter o seu rosto conhecido entre tantas outras coisas. O que ele não sabe porque ninguém lhe contou é que o José, o Francisco, até mesmo a Maria t~em uma trajetória parecida com a sua. No caso da Maria quase sempre existe um agravante: o ventre cheio ou os braços ocupados por uma criança de destino incerto.
Bem que João lutou para sobreviver de maneira digna, mas a massa o empurrou no canto e não satisfeita com isso, passou por cima dele. Aí João desistiu. Existe uma parte de sua vida que deletou, inclusive seu futuro. Não tem mais sonhos nem ambições. Não se preocupa com o presente enquanto apaga seu passado da memória. Não sabe mais quem são seus irmãos, se é que ainda tem irmãos. A imagem de seus pais quase que se apaga na memória. Incrível como o sofrimento em pouco tempo detona a dignidade humana. João é só mais um rosto sofrido dos muitos que sofrem no país-afirmam alguns. Mas antes de tudo, João é único, tem sua dignidade própria que, embora já esquecida, demonstra sua fragilidade na falta de expectativa. Aprendi muito com João. Sua dignidade ferida ensinou-me a valorizar a minha e lutar pelas daqueles que estão jogados à margem da sociedade.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Poetizar a vida

Eu busco inspiração
Pra escrever uma poesia
Que acalente o coração
Do menino sem alegria
Que possa dar razão
À vidas que são vazias
E que arranque da escuridão
Olhares longe da luz do dia.

Eu busco inspiração
Pra transformar as letras do papel
Em singelas mensagens
Necessárias porém.
Busco inspiração
Pra descrever a fome de quem não tem pão
A sede do planeta que já se começa a sentir
A tristeza dos sem expectativas
A falta de trabalho para os sem chances
A ausência de dentes para quem já não consegue sorrir.

Num mundo onde se come o sal do próprio súor
E se bebe as próprias lágrimas
Eu busco a inspiração tão precisa
Para colocar no coração das pessoas
A esperança insubstituível
De que letras em versos
Têm poder de transformar o mundo.

Poetizar a vida ainda é remédio para os males humanos...

domingo, 19 de abril de 2009

Parafraseando...


Quero o sol do amanhecer;
A luz do meio-dia;
O crepúsculo do entardecer.
Num país de sombras mortas...
De nomes desnomados...
Do esquecimento das dores alheias...
Da inércia social;
São coisas que acalentam a alma!

domingo, 29 de março de 2009

Fica em mim...


Fica em mim nem que seja por um instante
Porque nesse instante terei força para viver a minha vida toda...
Fica em mim e deixe-me saber
Onde começa o prazer e termina a dor,
Que só se acaba com sua chegada.
Tenho janelas em meu coração
E mesmo que não as tivesse
Você poderia sair pela porta
Pois tem a chave dele.
É por isso que insisto: fica em mim,
Mesmo que como lembrança
Que de tanto ser lembrada
Se espelha no real
Fica em mim porque eu, para sempre
Quero ficar em você...

Oração do filósofo


Razão minha que estais na consciência
E que de uma forma ou de outra coordena minha vida
Não me desamparais nunca
Minando meus sentimentos
Assim como expande meu intelecto.

As dúvidas todas dai-me hoje e sempre
Aumentai em mim o amor à sabedoria
Irrigai minha mente com o senso crítico
E inflamai minha ação de indignação
Para que não me cale diante das "verdades"
E jamais fique preso ao senso comum.
Assim seja!!!

quinta-feira, 26 de março de 2009

O beabá do amor

O auditório estava silencioso, apesar do grande número de pessoas. A apreensão era aparente. A palestra sobre sexualidade era inédita naquela cidade interiorana e de gente simples. A Doutora Elizabete também se encontrava apreensiva. O fato, prestes a se suceder era também inédito na sua longa e vasta carreira profissional. Sempre palestrara para pessoas de alto nível de conhecimento, mas agora estava ali, praticamente já cara a cara com uma platéia de pessoas simplórias e imaginava ela, algumas até conservadoras.Temia mais os comentários destas últimas, para as quais bem sabia que, qualquer expressão ou palavra referente ao sexo, era pior que xingar a própria mãe.
No meio de toda aquela platéia, encontrava-se Tião que, de tão simples que era, achava que era muito sabido. Imaginem vocês o desfecho desse acontecimento: o encontro de uma doutora em sexologia com um arretado simplório metido a besta. O título da palestra era: "O beabá do amor". A Doutora pretendia conseguir conscientizar ao menos alguém sobre a importância de cuidar de quem se ama, usando preservativos e etc; coisas que a maioria das pessoas daquela cidade abominava, em função de um retardadismo religioso e moral sem base alguma. Mas eis que o inusitado acontece. Chega o momento da palestra se iniciar; a Doutora Elizabete se posiciona diante da platéia no mesmo instante em que a multimídia é ligada, jogando luz numa parede do auditório especialmente reservada para isso. Em letras garrafais, de cor vermelho púrpura e tremeluzente, a platéia, juntando as letras em sílabas e formando as palavras leu: "O beabá do amor-por Doutora Elizabete Cordeiro..." e alguma coisa a mais que por ser escrito com letras pequenas não foi possível ser decifrado.
Quando o primeiro slide entrou na tela, a pergunta que trazia era a seguinte: "O que significa o beabá do amor?". A Doutora não ficou atrás e questionou a platéia sobre o que lhes significava aquela expressão, se alguém tinha uma resposta para aquela pergunta. Foi aí que tudo aconteceu. Tião levantou-se, pigarreou, limpou a garganta e acenando para ser notado gritou:
-Eu sei, dotora, eu sei...
-Muito bem, aproxime-se- disse a Doutora -Poderia me dizer seu nome por favor?
-Quar dotora? U di batismu ou u du povu?
-Qual você quiser. Você tem dois nomes?
-Óia dotora, tê dois nomi num tenhu, mais assinu um i u povu mi chama di otru...
-Sei...
-Meu nomi di batismu é Sebastiãu, mais u povu mi chama de Tiãu...
-E por qual posso te chamar?
-Quar quisé dotora, mais dexu craru qui perfiro Tiãu. É mais íntimu...
-Tudo bem, Tião- disse a Doutora, começando a perder a compostura, o que era claro quando se punha a alisar a blusa ou a limpar os óculos -Você disse que a expressão "Beabá do amor" lhe significa alguma coisa- afirmou com relutância, uma vez que questionava a impertinência daquele simplório cidadão e em que direito se encontrava para achar que tinha intimidade com ela - Você pode nos dizer então?
-Óia dotora. Na verdade, num é só u qui eu pensu né. Querdito qui a maioria dessi pessoar pensa a mema coisa...
-Está certo Tião; poderia nos dizer?- mais uma vez questionou a Doutora, percebendo sua impaciência começando a aflorar.
-Pudê, possu!Mais a dotora tem qui considerá u siguinti: deisdi qui butei o zóiu nu cartaiz da venda qui tenhu pensadu muitu sobri u significadu dissu tudu...
-E chegou a alguma conclusão? Se chegou diga, por favor- quase que gritou a Doutora Elizabete contendo ao máximo que podia sua impaciência.
-Tá bão dotora, vô dizê...
Fez pose de intelectual e disse:
-Bom, u primeru b do beabá é bejo...
Ouviu-se em uníssono um Oh na platéia. A Doutora ficou zonza:"Até parece mesmo que amor se resume em significados de letras"- pensou. Mas mesmo assim resolveu dar corda para Tião:
-E o a Tião, significa o quê?
-É amassu dotora.
Dessa vez o que se ouviu na platéia foi um coro de uis.
-Bem Tião. E o outro b, o que significa?
O que se ouviu momentos depois foi um estardalhaço de risadas misturados com um coro de cruz-credos.
Tião, na sua inocência ou metidez de achar que muito sabia, disse algo que fez a Doutora em Sexologia, Elizabete Cordeiro, perder a respiração; não pelo significado do que disse, mas pela expressão que saiu de sua boca:
-É bulinhá, dotora, é bulinhá...

sábado, 7 de março de 2009

"Finito enquanto se vive...Eterno depois que se morre!"


"No leito, antes do amor conjugal, repousa agora um cadáver".

Jaz ali.Fria.Os lábios tão ardentes em tantas vezes a reclamar um beijo apaixonado, agora estão incólumes e gélidos.Aqueles olhos de esmeralda a esbanjar simpatia formando par com o largo sorriso de dentes alvos, agora estão semicerrados. Opacos. Aquelas mãos tão bem cuidadas que tanto souberam acarinhar agora estão imóveis. Já não circula mais sangue por ali a torná-las quentes, por isso tudo é muito frio. Aquele corpo bem torneado, de boas medidas, motivo de ostentação de todo um ego, de toda uma vida, agora descansa frio sob a camisola de seda com a qual costumava dormir. O próprio ambiente tem uma penumbra estranha, mal iluminado por um pequeno abajour de cabeceira. É, Helena morreu. Sua voz não mais será ouvida; sua alegria jamais sentida; seu amor jamais partilhado. Tanto amou Helena que, muitas vezes, nos seus exageros afirmava que o amor "é finito enquanto se vive e só tem chance se ser eterno depois que se morre". Por isso se fazia necessário amar intensamente a finitude do amor. Sua própria vida falava por suas palavras. Casara-se por sete vezes e o homem com o qual estivera até agora não era seu marido, a não ser um amante. Nunca se arrependera do que fez. Acreditava que, se o casamento se acabava, era porque o amor chegara a seu fim. Não o amor em seu sentido ou existência universal, mas o amor construído dentro de um relacionamento mais íntimo. Também nunca chorara por uma separação, pois sabia que era a vida a lhe oferecer nova oportunidade de ser feliz, de experimentar um outro tipo de amor com uma pessoa diferente. A única lágrima chorada por Helena,saíram de seus olhos momentos antes de seu fim, porque compreendera que a vida não lhe daria mais a chance de ser feliz, de fazer novas experiências. Foi somente por isso que chorou. Helena não tinha medo da morte.
Seu amante, sentado na cadeira, tendo as costas presas ao espaldar a observava nos seus instantes finais de um mal súbito, de uma morte sem explicação e foi ele quem estancou a única lágrima de Helena com um lenço de papel, para depois apertar esse mesmo lenço contra o peito. Seria agora sua relíquia. Sua lembrança. Como Helena, acreditava que o amor era finito enquanto se vive e ele bem sabia que voltaria a amar outras mulheres. E mais, as amaria intensamente, de maneira louca. Única. E seria taxado de louco, como é louca a vida de quem ama, nem que seja por um breve período de tempo.
Helena, depois de ultrapassado o limiar sutil que a morte impõe para um outro tipo de vida, se comoveu ao notar tanta dedicação, um gesto tão nobre e ao mesmo tempo, cavalheiro de um simples amante, quando este lhe enxugou a única lágrima. Percebeu que continuava a amá-lo, apesar da impossibilidade de tocá-lo, beijá-lo e sorriu. Seu amante também sorria e parecia sorrir para ou com ela. Na linguagem muda do olhar, ela afirmou: "Este amor que lhe tive e que ainda lhe tenho vou guardá-lo para a eternidade". Ao contrário, seu amante ao sorrir, raciocinou: "Foi bom enquanto durou. Descanse em paz Helena, mas existem outras Helenas que por mim esperam".
Helena seguiu então, o rastro de luz, conservando no coração o amor que guardara para a eternidade. Seu amante porém, levantou-se da cadeira para tomar providências com a autópsia, velório e sepultamento.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Se fosse você...


A vida é feita de possibilidades e estas são muitas e às vezes indefinidas.
Brinco em sonhá-las, em imaginá-las, por exemplo, como eu seria se fosse você!

Se fosse você me beliscaria todas as vezes que tento fugir da realidade...
Se fosse você não faria juras de amor, aliás, nem ao menos me apaixonaria por causa de um simples beijo...
Se fosse você sorriria quando a calúnia se fizesse presente...
Se fosse você não me estressaria por futilidades, embora entenda que são essas futilidades que nos estressam...
Se fosse você não comporia várias músicas, mas uma só várias vezes, em tons e ritmos diferentes, porque assim levaria minha mensagem adiante...
Se fosse você não escreveria mil coisas em mil pensamentos, pois uma palavra sempre pode resumir tudo...
Se fosse você não dormiria até tarde, porque observar o amanhecer é uma experiência única que nunca volta...
Se fosse você não passaria minha vida toda trabalhando, mas tomaria alguns de seus momentos para mim...
Se fosse você não questionaria tanto as pessoas, porque compreenderia que muitas coisas não precisamos saber para viver bem a vida. A propósito, seja bendito o ignorante...
Se fosse você brincaria mais e não levaria a vida tão a sério; aliás, esse é um dos segredos da longevidade...
Se fosse você criticaria menos e ajudaria mais...
Se fosse você colocaria mais sentimentos em minha vida, ao invés de me permitir ser dominado pela razão...
Se fosse você derramaria mais lágrimas e não as estancaria quando viessem ou disfarçaria quando irremediavelmente caíssem...
Se fosse você, faria uma porção de coisas que gostaria de fazer, mas que sendo eu não consigo...
Se fosse você seria mais humano e compreensivo e não me preocuparia em agradar tanto as pessoas...
Se fosse você seria mais sincero comigo, não fugindo de minha essência...
Se fosse você, tropeçaria numa única pedra de cada vez para aprender a me desviar delas...
Se fosse você, aprenderia a me felicitar sempre que ultrapassasse algum percalço ou vencesse alguma dificuldade...
Se fosse você, não enxergaria tantos problemas, mas os caminhos para vencê-los...
Se fosse você sempre tentaria de novo, apesar dos muitos erros...
Se fosse você me admiraria mais e até me acharia bonito quando porventura, me olhasse no espelho...
Se fosse você aprenderia com os erros e não faria dos erros um motivo para a derrota...
Se fosse você, seria o mesmo sempre, sem necessidade de usar máscaras...
Se fosse você, correria contra o tempo, gritando aos ventos, a coragem de meu coração...
Se fosse você, pediria sempre bis às coisas boas da vida...
Se fosse você daria outros nomes às coisas porque isso também é sonhar...
Se fosse você escreveria com letras garrafais o nome do ser que roubou meu coração na lousa da escola...
Se fosse você silenciaria quando preciso e só falaria quando solicitado...
Se fosse você não insinuaria coisas, mas as diria, clara, objetiva e em bom tom...
Se fosse você desejaria e mais, lutaria por um mundo melhor com mais respeito ao próximo...
Se fosse você seria mais eu mesmo do que os outros...
Se fosse você...
Mas infelizmente (ou sabiamente)
Deus me permitiu ser apenas EU!!!

EU QUIS


Eu quis te dar o mundo, mas você preferiu um punhado de terra;
Eu quis te dar o céu, mas você escolheu uma constelação tão somente;
Eu quis te mostrar a verdade, mas você afirmou convicta que minha verdade era mentira e;
Que sua mentira era verdade.
Eu quis te abrir os olhos, mas você me disse que já usava colírio...
Eu quis olhar nos teus olhos e sondar seu coração, mas;
Seu coração tão fechado não permitiu que seus olhos olhassem os meus.
Eu quis te falar de amor, de sonhos;
Mas você enfática me disse que nos seus sonhos não se falava de amor.
Eu quis sacudir seu mundo e te mostrar que a realidade é bem outra daquela que você vive;
Mas me afirmou que a sua realidade era construída por você mesma e que eu não fazia parte dela;
Eu quis que todos os seus dias fossem lindos e que todas as suas manhãs tivessem sol,
Mas você me contou que também gosta de chuva.
Quando eu quis te falar de sentimentos, você cortou minhas palavras dizendo que não acredita neles,
Principalmente naqueles que juram ser eternos.
Tanto eu quis...
Tanto você não quis...
Cansei...
Hoje fiquei sabendo que me quer...
Mas agora sou eu que não te quero mais!!!

Lamentos de um drogado


Lua cheia, luzes apagadas, sonhos perdidos;
Caminho vago, esmerando-me em coisas absurdas.
O cigarro queima a minha boca...
Enquanto esquenta o meu corpo.

Está frio: um arrepio me percorre o corpo;
Indo gelar minhas entranhas.
A maconha acabou...
Joguei as seringas na última lata de lixo pela qual passei.
Não tem nem uma alma viva na rua...
Nem um sonho ao qual apegar-me.

Solto um pouco de fumaça,
Vejo-a subir lentamente no ar e penso...

Talvez ela leve coisas, pedaços de mim.
E leva ao nada...se ao menos levasse ao céu
Talvez os santos tivessem pena de mim
E me olhando com compaixão me ajudassem.

Queria morrer, acabar com minha vida
Mas sou covarde, não tenho coragem para isso...
Prefiro que as drogas o façam.

Sou um inútil na vida, querendo gritar aos quatro cantos do mundo a minha dor
Talvez assim, ao menos as pedras me escutassem
E dessem valor às minhas palavras, ao meu grito.

Tudo perdeu o sentido para mim.
Não vejo uma só mão estendida para ajudar mas...
...enxergo outras tantas para me acusar;
Para jogar o meu erro na minha cara;
Como se esfregasse merda no meu rosto.

O cigarro já acabou, mas continuo a tentar fumá-lo.
É minha única companhia nesta noite fria;
O único calor que recebo, mesmo me matando.
Acho que vou conversar com suas cinzas, quando ele irremediavelmente acabar,
Procurar suas fagulhas no meio da rua.

Quem sabe assim, a noite se acabe logo,
E o sol nasça diferente,
Como nunca nasceu antes...

A Verdade


Vou me despir...

Quero estar nu quando a verdade chegar.

Vou deixar-me vestir por ela!

Sinceridade acima de tudo, transparência antes de qualquer coisa.

Assim, ao me olharem em pele nua,

Compreenderão a minha verdade na nudez de meu corpo,

Na transparência de minha pele que está nua,

Na sinceridade de minhas palavras cruas,

Embora meu olhar obscuro, ainda tente esconder alguma coisa de mim e;

Minha aparência insegura tente sobrepor a mentira à verdade...

Máscaras...


Sou um mascarado
No ambiente que é uma máscara
Que esconde aquilo que de fato é.

Sou um mascarado
Porque idéias alheias não se identificam com as minhas e
Nem as minhas com elas.

Sou um mascarado
Naturalmente assim
Não por coerção ou repressão
Muito menos por vontade própria.

Sou um mascarado
Por causa daquilo que não sei e
Que talvez nunca saberei
Mesmo que passe minha vida inteira a buscar saber.

Sou um mascarado
De uma máscara inerente à pele de meu rosto
Que também encobre o que sinto
Além das aparências...

Sou um mascarado
Por buscar nas máscaras o sentido
De toda uma vida que se vive
Mascarada!

terça-feira, 3 de março de 2009

A vida se descobre assim...


Caminhei pelas encruzilhadas vagas de espaço e cheias de podridão
O sol queimando meu rosto, turvava minha visão
Via espinhos mais que rosas
Via sombras mais que luz

A vida se descobre assim...

Tantos caminhos a percorrer, tantos percalços a ultrapassar
Tantos medos para vencer, tantos sonhos a realizar
Tantas coisas para escolher e decidir por uma só
Tantas histórias para escrever, mas uma única redigir
Tantos desejos a fluir, mas um só satisfazer de cada vez
Tanta vontade de sorrir, mas às vezes chorar
Tantas pessoas para ajudar, mas a apenas algumas me dedicar

Sinceramente, não sei se a vida se resume nisso...
Só sei que ela se descobre assim...

Assim sou eu...


Certo dia, numa rua sem movimentos que me permitia refletir um pouco, alguém me perguntou quem era eu. Confesso que aquela pergunta me pegou desprevenido pois na realidade ninguém pára para pensar a respeito disso; além do que tecer um comentário sobre o que se é ou o que se deixa de ser é uma tarefa nada fácil. Depois de muito pensar, redigi umas linhas que em forma de poesia, senão respondeu aquela pergunta, ao menos me fez refletir um pouco mais sobre a existência, a minha existência...

Sou um simulacro abstrato
Sem consciência nem ciência
Que expõe minha demência
Nos membros de meu corpo.

Não sou sentimental nem racional
Sou exatamente o espaço entre os extremos
Minha fé permeia conflitos
Minha confiança não atravessa o muro que sou eu
Minha sombra?Que fantasma
Impossibilitado da realidade
Incapaz de coerção e oticamente iludir
De fato, não sombreia o que sou...

Simulacros não existem e
Os espaços são relativos
E eu não passo de nada
Não por opção, mas por consequência
Daquilo que diz ser minha essência...

Eu que sou como sou e
Tão simplesmente sou...

Mesmices...


O tempo corre e
A vida aqui continua a mesma...

Os mesmos sentimentos
Aqueles que colocam um vazio no ser...
Ou então fazem de fato sentir
A perda de um pedaço de vida.

Os mesmos pensamentos...
Aqueles que são sempre dirigidos mas
Que nunca chegam a lugar algum.

As mesmas pessoas...
Pois sou indiferente a elas.

A mim só uma importa...aquela que tomou espaço em meu coração...
O mesmo coração que só pulsa
Pra prolongar o meu exílio...

O mesmo corpo que insiste em guardar para si
O amplo espectro da solidão, do sentir vazio...

Para mim hoje, o que muda é só o tempo
Porque minha vida continua a mesma...

segunda-feira, 2 de março de 2009

Saudade...


Vem de longe
Chega de mansinho
Traz lembranças cortando
Caminhos da imaginação...
É marota no trejeito
Invasiva na ação
Corrosiva com o passar do tempo
Coisas próprias da razão.

Não tem dó nem piedade
De uma lágrima erma de início e
Torrentosa de final
E se arranca um suspiro
Sentido de lá de dentro
Vangloria-se da segurança
Até por ora superficial.

Saudade é sentimento, pensamento
Que na nostalgia se multiplica
E perturba a razão
A emoção então desponta arraigando o desalento
E a crise se complica
Enquanto explora o coração.

E se não se toma um juízo
Na cama ela te joga
E das lágrimas te sacia
Enquanto que anuvia
A visão do paraíso...

Ter saudade é bom,
Mas bom mesmo é ter medida
Se por um lado ela comove
Por outro divide a vida.

A bunda


A bunda vaga
Vaga a bunda
Presa dos olhos desejosos
Vulgar aos olhos conservadores.
A bunda vaga
Vaga a bunda
Atada ao osso da perna
Presa ao músculo da coluna.
A bunda vaga
Vaga a bunda
E num passeio numa rua movimentada
Chama a atenção de outras transeuntes
Que apesar de terem a bunda que vaga
Nem por isso são vagas as bundas...
A bunda vaga
Vaga a bunda...

domingo, 1 de março de 2009

Desejos Ocultos...


Mãos que passeiam...
Olhares que se cruzam...
Ou que acompanham os movimentos das mãos que passeiam.
Desejos que se afloram de
Tocar a pele...
Beijar a boca...que disfarçadamente pede um beijo.
Necessidade de sentir a carne a
Apertar por mãos que não tem dedos...
Desejos ocultos de
Colocar o próprio desejo em evidência...
Tirando do oculto
O instinto naturalmente humano!

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Parafraseando...


Estou a toa na vida;
Estou simplesmente por estar;
Pois não tenho intenção de aprofundar mistérios e nem mesmo sou um ser sério,
Quando da busca da objetividade, enfaticamente sobreposta na vitrine de minha vida.
Quero aproveitar o momento para confundir feições dispersas em tantas outras vitrines
Expostas
Na loja cosmológica da dança e processo do universo
Explícito no verso e no reverso de tantas outras mentes pensantes
Deteriorizantes de certas realidades
Investidas no inverso do universo real.
Existo tanto quanto o pensamento (será?)
Ou penso que existo
Em nada insisto
Também em nada desisto
Mantenho a fé e a calma
Que se existir alma
Simplesmente da mão a palma serena
Se molhará...

Não sou radical
Vivo na fronteira
E em meio à besteiras, somadas com sujeiras de coisas
Que só transmitem asneiras.
Estou sempre à beira
De uma enorme eira
Que em duas se divide.
Me ponho entre fileiras
Sem ter medo de ser atingido...
Talvez até mesmo seja alvo...
Mas quero viver o momento
E tal como o vento
Feliz em seu desabalamento
Flutuar no meu viver
Vivendo a toa minha vida...

domingo, 8 de fevereiro de 2009

A Matemática da vida


Na SOMA da vida sou apenas mais um;

Diferente talvez, mas só mais um.

E cada dia procuro a EQUAÇÃO exata

Que possa dar RAZÃO ao que vivo

E ao que sinto


Na PROPORÇÃO de meus pensamentos

Expando meus sentimentos

E se com a CHAVE do tempo

Fecho as vezes meu coração

Com os COLCHETES dos dias arremato minha existência

No mesmo instante que PARÊNTESES em branco

Revelam a ausência de mim.


Se MULTIPLICO meus momentos com meus conhecimentos

E os DIVIDO com minha ignorância

SUBTRAINDO desse RESULTADO meus relapsos de memória,

Obtenho em IGUALDADE a RAÍZ QUADRADA do sentido que se dá à vida...

Não à vivida, mas à que se permite viver.


Mas se, nas minhas CONTAS errar uma VÍRGULA, colocando um ZERO a mais ou a menos, mesmo que de esquerda,

Me vejo obrigado a entender a DIFERENÇA, a sutil DIFERENÇA

Entre um INFINITO e uma DÍZIMA PERIÓDICA,

DIFERENÇA essa que vai além das reticências.


Na vida sou prático e na prática da REGRA DE TRÊS tão SIMPLESMENTE RESOLVO meus PROBLEMAS

Porque afinal de CONTAS, não preciso de mais nada para viver

Que ter saúde, amar e ser feliz.


Mas, se por acaso, na distração, uma REGRA DE TRÊS se COMPÕEM complicadamente

Fixo minha atenção.

Então o X e o Y do PROBLEMA

Que nada mais são do que INCÓGNITAS inerentes à existência

Se despem

E se transformam em NÚMEROS, tão NATURAIS como a própria criação.


É, na ARITMÉTICA da vida

Não importa os TEOREMAS ou os PROBLEMAS

Pois há que se SOMAR o amor

SUBTRAIR a dor

MULTIPLICAR as alegrias

E DIVIDIR com todos, mas com todos

Aquele ESPAÇO que, entre PARÊNTESES ou não

Poderia ser entendido como o MÁXIMO DENOMINADOR COMUM...

Simplesmente, tão simplesmente

A MATEMÁTICA DA VIDA!!!

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Retrato de uma relação quase sexual


Primeiro vem o olhar,

Culminante num ardente beijo,

Arde então o desejo,

De correr as mãos pela pele,

Sentí-la nua, eriçada,

Pelo prazer de ser tocada,

Degustada por uma mente que talvez

Só pense em sexo.


Depois os olhares se fundem

Contemplam um isomorfismo paralelo,

Enquanto os lábios se tocam

E as mãos passeiam.


São dois corpos distintos, buscando uma unificação

No desejo de ser um só.

São duas almas que não são gêmeas

Mas que procuram alguma coisa que as identifique no comum.

São dois corações que pulsam em ritmo acelerado.

São quatro mãos que se agarram em dois corpos

Sem pretensão de se soltarem.

São palavras sussurradas, entremeadas pelos suspiros,

Enquanto que o calor dos corpos aumenta.


Retrato de uma relação nada formal...

Mas quase sexual.

O Tempo


Passou sem um medo de nada;
E quis se ausentar por um segundo.
A vida nada mais é que uma soma de emoções;
E não imaginou que aquele segundo de ausência
Duraria a eternidade ou o resto de uma vida.

Deixou porém seu nome rascunhado no ego;
De quem o viu ou o deixou passar sem interpelar;
Tão claro que até o espelho vê e diz...
Sem nem poder mentir.

Para alguns foi remédio;
Para outros, sofrimento;
Para outros ainda foi felicidade, alegria.
No entanto, outros quando o viram passar,
Afirmaram que alguma coisa iria acontecer;
Falaram que era seu fim, conjugando-o no plural;
Porque enquanto passava todos o dividiam;
De tal forma que gerou incontáveis filhos.

Mesmo quando se tornou sofrimento, não quis dividir sua dor;
Pois alguns filhos seus estavam felizes e,
Injusto era acabar com tamanha felicidade.

Seu maior erro foi quando quis se ausentar por um segundo,
Porque nesse segundo de ausência...
A criança parou de chorar e os pais se esqueceram que eram pais...
O jovem quis ser diferente, se esquecendo que diferença é algo que só ele mostra enquanto passa
E se afundou no submundo...
O adulto se esqueceu de seus deveres, mas depois quis cobrar seus direitos, como se isso fosse justo...
O idoso parou de reclamar, poruqe se conformou que a vida deveria ser assim mesmo...

Quando porém, retornou de sua ausência;
Acabou com as reticências e;
Ordenou logo um ponto final.
Porque afinal, no final das contas,
Da soma das emoções,
Ele se acaba para todos;
Sem exceção...
O TEMPO.